segunda-feira, 2 de julho de 2012

Espiritualidade Missionária Scalabriniana

O seguimento de Jesus Cristo se expressa em diferentes espiritualidades. Estas podem ser comparadas com a roda de uma bicicleta, formada por raios e o eixo central. Cada raio nos lembra uma espiritualidade cristã diferente, cada uma destacando e sublinhando algo do mesmo mistério. Contudo, todos os raios apontam para o centro: todas as espiritualidades cristãs apontam para Jesus Cristo e o Deus de Jesus Cristo. Todos os raios estão unidos na mesma roda, que pode ser comparada com a comunidade cristã, com a igreja, lugar de comunhão das inúmeras experiências do mesmo Cristo. Podemos, assim, entender que a diferença das espiritualidades não é motivo de fragmentação, competição e conflito, mas revelam a riqueza das muitas possibilidades do seguimento do único Mestre. Neste contexto, seguem, de modo sintético e limitado, os traços da espiritualidade missionária escalabriniana. 

A espiritualidade missionária scalabriniana brota da experiência bíblica. A memória do Antigo e Novo Testamento está enraizada na experiência de um Deus que caminha com seu povo. A Bíblia começa no Gênesis num jardim e termina no Apocalipse com a chegada numa cidade: a Jerusalém celeste. As páginas que retratam caminhada, saída, chegada, êxodo, migração são numerosas: desde Abraão e os outros patriarcas, passando pela experiência do êxodo no Egito e do exílio em Babilônia até Jesus que é retratado pelos evangelistas como um andarilho, para terminar, depois da experiência pascal, nas viagens missionárias dos discípulos entre as comunidades espalhadas no império romano. Nas entrelinhas das palavras bíblicas, podemos perceber uma caminhada de amadurecimento que vai da tomada de partido de Deus em defesa dos migrantes (Dt 10,17-19) até a identificação de Jesus com o mesmo migrante (Mt 25,35).

A espiritualidade missionária scalabriniana brota da experiência de Scalabrini. Como o bom samaritano (Lc 10,29-37), Scalabrini se deixou interpelar pela realidade de sua época, marcada profundamente pela migração. Surgiu uma resposta integral, para acompanhar e defender os migrantes. Elaborou uma visão da migração que não somente percebia o drama e os perigos, mas também vislumbrava a ação de Deus escondida por detrás deste fenômeno, enxergando a providência divina em todos estes acontecimentos.

A espiritualidade missionária scalabriniana brota da experiência de cada um de nós ao lado dos migrantes. O encontro com os dramas e as alegrias dos migrantes faz brotar uma espiritualidade de encarnação, que se manifesta na acolhida, comunhão, inclusão e valorização das diferenças. O encontro com a experiência do êxodo dos migrantes nos ajuda a viver a “itinerância” e ser peregrinos na direção do outro. O encontro com o migrante nos desafia a viver a comunhão na diversidade, denunciando os projetos de exclusão, de eliminação das diferenças e anunciando o projeto de Deus que cria uma dinâmica que nos faz passar continuamente da comunhão para a diversidade e da diversidade para a comunhão.

A espiritualidade scalabriniana é extremamente atual e profética. Nunca na história a humanidade experimentou tantos encontros de pessoas e povos de culturas e etnias diferentes num ritmo sempre mais acelerado. Contudo, o nosso mundo se caracteriza também pelo individualismo, anonimato, competição, globalização, lógicas de exclusão, onde o ser humano corre o perigo de ser um simples número, a existência uma grande corrida, a vida sufocante, as relações funcionais e onde cresce a concentração de indivíduos, sem, porém que isso signifique encontro de pessoas. A espiritualidade missionária scalabriniana, alicerçada em Jesus Cristo, inspirada em Dom Scalabrini, apóstolo dos migrantes, tentam criar comunidades onde, em nível interno aconteça a saída de si mesmos, acolhida, encontro profundo, comunhão a partir das diferenças e não apesar das diferenças, diálogo, solidariedade, valorização da dimensão cultural como algo a ser partilhado. 

A mesma espiritualidade missionária scalabriniana guia em nível externo as comunidades e as pessoas rumo à abertura aos outros, ao mundo, a Deus, o diálogo com o diferente, o testemunho do respeito recíproco, o anúncio de um mundo sem barreiras, a denúncia do escândalo da exclusão e da discriminação.

Desta forma a espiritualidade missionária scalabriniana antecipa, de maneira parcial, o encontro do ser humano migrante rumo à comunhão definitiva com Deus.

Pe. Alfredo Gonçalves, cs.
Missionário Scalabriniano

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